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(...) - Somos bravos, somos fortes, nada pode nos parar - grita o capitão com voz imponente do topo da proa, encorajando todos os seus marujos a enfrentar a fúria do mar que põe à prova a resistência do velho galeão no mesmo instante que fecham-se as pesadas cortinas de veludo** verde-turmalina. Fim do terceiro ato.
Será que tudo não passa de uma grande farsa? Tudo não passa de uma grande encenação? Este imenso palco à nossa volta, o ruidoso público que te aplaude, te vaia, sofre e parece querer viver junto contigo cada personagem. Você jura estarem ali, todos logo ali, os mais queridos, atentos, na primeira fila e alguns conhecidos e curiosos pouco mais atrás, todos escondidos detrás da potente luz do holofote direcionado em seu rosto que te ofusca a visão. São todos tão vivos, todos tão reais que você se nega a duvidar ou questionar sobre sua real presença nas confortáveis poltronas-acolchoadas que formam o teatro da vida.
Mas porque não temos acesso ao roteiro completo, a toda história afim de fazermos pequenas adaptações e melhorar o espetáculo. É como se fossemos lendo cada parte minutos antes de entrar em cena e enquanto estamos lá frente ao público, no camarim sob uma luz paupérrima de um candelabro o autor continuasse rascunhando as próximas falas, passos e destinos à bico-de-pena, fundamentando-se em cada expressão facial, gesto e até mesmo erros de script da cena atual.
Acho que sempre será assim e por mais hábeis e atentos que sejamos o destino se encarrega de esconder o que existe lá adiante. É como se tudo fizesse parte de um futuro que ainda no ventre fora meticulosamente traçado só para ti, mas que apesar de toda curiosidade ele permanece inerte, frio e calculista escondido e sob esta forma de noite-escura te envolve, te mastiga e te devora, te empurrando em direção aos mais adversos caminhos enquanto supervisiona cuidadosamente toda e qualquer decisão com olhos de chacal, cruelmente saboreando os últimos segundos da sua presa antes de deflagrar o bote feroz e fatal sob forma de punição pelas escolhas erradas. E o maldito parece se divertir com isto.
São os maus-amigos da infância, são aquelas brincadeiras toscas tarde da noite, os primeiros medos, os primeiros choros, as tristezas, a primeira briga, a primeira paixão. É deparar-se eternamente frente aos velhos problemas que todos tiveram e todos daqui para diante também terão. Questiono-me, por que o conhecimento não é genético, a experiência, a sabedoria, porque temos que sempre reaprender tudo. É tudo tão cíclico, cansativo e mesmo assim estamos vivendo exatamente os mesmos medos que viveram nossos pais, o que muda é o cenário e o nome do personagem. O risco de se perambular por esta terra com 10.000 destinos à sua frente que às vezes nos impedem de agir nos faz temer e errar, tropeçar e cair no chão e de lá, arrasado, com olhos cheios de lágrimas ter de provar da amarga derrota e mostrar a si mesmo que tens forças para novamente se erguer.
E se nos permitíssemos errar mais, sem ter medo das retaliações ali adiante? Acho que vou me permitir ser mais cão, menos humano. Ser mais tolo, mais feliz, mais brincalhão, mais preguiçoso, mais satisfeito simplesmente por me jogar num lago em busca de uma vareta ou então silenciosamente adormecer sob o chão debaixo de meus pés. Vou explodir de alegria sem pensar, correr em busca dos meus sonhos, caçar vagalumes, olhar o sol, acompanhar a chuva que escorre pelo vidro da janela, te trazer para perto e tentar te fazer infinitamente feliz. Quem sabe o roteirista não se comova?
Definitivamente, vou me permitir arriscar. Vou sem motivo aparente correr atrás de carros invisíveis, esperar no portão com rosas em um dia corriqueiro que parecia não guardar mais nada de especial, chegar de repente arriscadamente de uma viagem louca só para ao pé do teu ouvido te confessar o sonho que se solidifica a cada instante. Quero outra vez ver o filme de sua vida passar diante dos seus olhos e ser abraçado por aquela garota tomada de alegrias, que transbordava pelo olhar sonhos-afetuosos como as pétalas-de-rosas que ainda presos aos botões formavam o buquê!
Vou contando os dias, atuando, vivendo, já quase com pressa para que se fechem novamente as cortinas e eu ganhe um novo script da peça, que já sonhei ter uma personagem para contracenar.
**Não chames de crueldade a sutileza de quem pouco a pouco está à conhecer tudo seu!