terça-feira, 6 de abril de 2010

.do lado realista



As pessoas precisam de tratamento, precisam de terapia. Ouso dizer que precisam é ter uma quantidade honesta de vergonha na cara também, uma pena que não vendem via internet isto. O mundo hoje, de um ponto de vista social, é como um pote de ouro ao final do arco-íris para os terapeutas e psicólogos. Todos os dias vê-se pessoas que, por um motivo ou outro, se apóiam em situações absolutamente e absurdamente frágeis para justificar suas atitudes recentes e isto é facil de se acompanhar dia após dia.

A pobre garota detrás do balcão, atendendo clientes o dia todo, exposta aos mais variados tipos de situação sendo alvejada pelos mais diversos tipos de humor e descasos, apenas pedindo um pouco de atenção sorri ao avistar um conhecido que rispidamente entra no recinto. Já é tarde e seu expediente teria acabado mas afinal, o que custa ser gentil, seria a glória após um dia cansativo. O chama pelo nome, lhe mostra toda gratidão e afeto que uma velha conhecida pode oferecer e se dispõem a exibir tudo que lhe cabe no momento, tudo para obter em troca um olá digno para um final de dia cansativo.

Quanta bobagem, tudo que consegue é uma atidude mecânica de assinar o papel, resmungar um boa-noite-tchau qualquer e sair porta afora sem perceber que acabara de romper com o último brilho de esperança de alguém. Esta história poderia muito bem ser uma metáfora saída da cabeça de algum doente qualquer que precisa de terapia, mas também pode ser uma absoluta verdade escrita com o objetivo de ilustrar o cotidiano de uma grande cidade de pedras que nos rodeia. Sem alianças, sem compromisso, sem alguém para descarregar uma dose venenosa de rancor acumulado ao longo de uma jornada ou mesmo algum colo aconchegante para se recostar e respirar aliviada, afinal sobrevivera a mais um dia como aquela segunda, que parecia interminável.

Sai do trabalho, senta-se em frente ao computador após engolir instintivamente algum alimento sem qualidade e inicia o curioso ritual de solidão em grupo. Atualiza seu perfil da rede social favorita, confirma o pedido de novos amigos e de alguma forma engraçada responde com a mensagem genérica, "olá, te add, nos conhecemos de onde? bj". Acho que o objetivo disto tudo não é exatemente colecionar estranhos, mas quem se importa a esta altura, são 36 novas mensagens pra serem lidas. São 3 convites pra jogos, 11 spans oferecendo medicamentos milagrosos para emagrecimento e destes 11, quatro solucionariam a impotência. 7 mensagens sem importancia alertando sobre os meninos sem pernas na eslováquia que precisam de doação, outras 4 pedindo para clicar no link qualquer abaixo citado, 7 avisos de pessoas comentando fotos alheias, 3 falando atualizações de perfil e uma, uma mensagem pessoal que pergunta: "Guria, quanto tempoooooo, anda sumida! Mande notícias, bjooooo!".

Caminha até a cozinha e lê superficialmente uma receita impressa atrás do pacote ilustrado com uma foto de uma refeição digna de algum hotel caríssimo no qual você nunca visitou, rodeados por pessoas transbordando felicidade, cercada pela família. Posta na outra rede social imediatista. "Bolo de banana com calda de caramelo" seguido imediatamente pelas hashtags #adoro #comerdecolher #dietaurgente. Apenas mais um suspiro que seus 365 seguidores não lerão mas fingirão ter dado importancia quando no máximo dois encaminharão ainda mais mecanicamente a postagem escrevendo algo como: "RT @loneny_star: Bolo de banana com calda de caramelo" seguido das hashtags #adoromuito #oqueebomengorda #sozinhaemcasa #noitesdesegunda.

Pronto, acabara de fazer seu papel de protagonista na grande sociedade do invisível, estrelando no espetáculo "ensaio sobre os sozinhos" que mostra um lugar onde vivemos ao redor de circulos virtuais de amizade e no momento que seu melhor amigo da semana passada troca o endereço de email não se tem mais contato e a partir disto cai no esquecimento imediato, fadado apenas a algum cumprimento rápido em alguma rua movimentada enquanto se está concentrado em chegar o mais rápido possível ao destino, pois já está quase atrasado para o trabalho.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

.do lado sombrio

De: Gus
Para: Silent
Data: 05/04/2010 - 17:36
Assunto: do lado sombrio (rascunho)

Tu é doente, vai te tratar... Publiquei!

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De: Silent
Para: Gus
Data: 05/04/2010 - 14:21
Assunto: RES: do lado sombrio (rascunho)

Não reclama que sem mim tu também não existiria, agora para de mi mi mi e publica.

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De: Gus
Para: Silent
Data: 05/04/2010 - 13:48
Assunto: RES: do lado sombrio (rascunho)

Cara, só consegui ler agora, foi mal.
Mas que humorzinho de merda tu anda hein sr. Silent, putz....

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De: Silent
Para: Gus
Data: 05/04/2010 - 08:11
Assunto: do lado sombrio (rascunho)


As brumas do tempo sopram incessantes sobre as cabeças dos que passam algum tempo ao nosso redor e esta, por sua vez, disfarçada de claro sentimento de afeto não perdoa, tampoco releva.
Dia após dia alimenta silenciosamente um desejo primitivo e implacável que empurra à força bruta uma inegável sensação de confiança e acomodação a ponto de podermos falar a quem for que nos rodeia o que bem quisermos. E não posso negar, esta sensação é maravilhosa. Muitas vezes também falo até com um certo prazer me escapando por entre os dentes, deixo transparecer.
Mas não se trata de extremos, de vontades reprimidas ou mesmo verdades a serem descobertas sob panos quentes, fumegantes. Apenas sei que um tiro à queima roupa é uma marca que fica por algum tempo rondando a cabeça, ainda mais quando a bala disparada fora embebida em alguma espécie de sinceridade líquida, que deixa um rastro amargo como féu, que arranha a garganta, inconfundível.

"Tu é doente, bipolar, só pode. Igual a sua mãe".

Eu compreendo hoje que meus melhores dias não são tão previsíveis quanto as estações do ano, contudo isto também não significa que te aconselharei a se afastar e construir uma barricada para que possa me impedir, te proteger.
O passar dos dias me fez aprender à duras penas que não devo me preocupar com pessoas que apenas vivem suas ordinárias vidas sem algum sonho em seu horizonte, apenas basta que não os convide para sentar junto à minha mesa, não interesse quantas cadeiras ainda restem.

Talvez seja isto que eu deva buscar daqui pra frente, e assim crescer para além-mar, transpassar o tamanho do meu corpo, ser gigante. Talvez um dia compreendam que não ficarei rindo à toa para fazer parte do meio em que estou inserido e neste dia, quisá, seja normal alguém se comportar como óleo vivendo no mesmo aquário, sem a necessidade de se misturar por completo com a água.

Ao fim de tudo, tudo são só pensamentos e estes sim, não têm limites.