Andei pensando dia destes sobre as fases do meu cabelo. Afinal, não se trata de um cabelo comum, é um cabelo com personalidade, com vontade propria, com alguma teimosia até. Ao contrário do que todos dizem: - Tenho cabelo rebelde... tem nada... é tu quem contraria a vontade dele. Ele quer ser assim: soltão, torto e patifado.
Já mudei tanto e a algum tempo pensei em deixar ele maior, não grandão, mas o suficiente para fazer uns dread-locks... mudar o estilo, sei lá. Meio 4 e 20 sabe... coisas que só consigo descobrir pensando muito, afinal eu tenho uma natureza inconsequente guardada em algum lugar do meu ser. O problema é que ela surge de supetão e nas horas mais impróprias. Não que eu saia por aí rasgando cheques é bem verdade, mas sei que para o dia terminar bem sempre tem de se enfrentar uma tarde inteira...
Já são quase 75 dias sofá de casa, 75 dias de horizontes de fim de tarde, 75 dias de Ana Maria Braga, 75 de Globo Esporte, 75 de Radio e Fogão ligados. E como passou rápido, pensaria minha metade otimista, afinal, nem sinal daquela dor que me desgraçou tanto a alguns meses atrás, nem sinal de noites em claro, sem poder sequer suspirar pois inflar os pulmões mexe a estrutura óssea, logo mexe com o pescoço que também mexe com a porcaria da vértebra quebrada. Percebe neste ponto da linha de raciocínio a coisa já começou a mudar de figura? Lá se vão 75 dias de saco cheio, de osso quebrado, de um insistente espaço de 1 dedo na vertebra, da tal lesão com deslocamento de massa a direita... porcaria... nada mais é como antes, nem mesmo o cabelo.
Como diz a música: E eu, que tinha tudo pra ser feliz: Segundo grau completo e curso de datilografia.... resolvi escolher o caminho mais longo até o fim das férias... loucura completa dizem uns, até o dono da Floricultura perto do apartamento velho me parou na rua dia destes... - O que aconteceu aí?
- Lesão de vértebra, quebrei a primeira
- Ouch disse como todos, repetindo sempre a mesma cara feia...
Pois é... lá se vão 75 dias de tudo isto, de não precisar enfrentar a tal sociedade, o tal mundo das barbas bem feitas e dos cabelos bem penteados. A distancia da sociedade é como o amor, ele devora calças, come sapatos e roe ternos. Degusta satisfeito metros e metros de gravatas, devora numeros de identidade, devora endereços, amigos e dias da semana.
Todos estes, por sinal, são como sábado. O dia neutro que fica entre a semana desgastante e o domingo tão necessário afinal tem futebol, com cabelo cretino e tudo.
Tudo isto é possível porque eu posso ficar do jeito que quiser e o cabelo também. Hoje acordei por volta das 9hs da manhã, já meu cabelo despertou só em torno das 11 e mesmo assim se arrastou até tarde à dentro... pra dizer bem a verdade só agora está bem desperto, despojado, esbanjando estilo e isto que nem está no modelo jamaicano ainda. Ele está solto, sem precisar pentear, sem precisar de bonés ou toucas, sem precisar sequer dar qualquer satisfação, afinal, sociedade e vida normal é o que acontece lá fora, não aqui dentro, não aqui no universo das salas, sofás, lesões e cabelos despreocupados do cotidiano.